“Dormindo com o inimigo”, filme que descreve o sofrimento de uma mulher maltratada, deixa o campo da ficção cinematográfica para retratar o cotidiano de muitas mulheres atualmente.
A fisionomia do mundo neste século foi mudada por transformações sociais que alteram o papel da mulher.
Obscurecido por antiquíssimos preconceitos originários da estima absurdamente baixa com que era tida universalmente, o mundo antigo dava pouca importância à mulher. Mas mudanças sociais relevantes, rompendo com os cânones tradicionais, aboliram o determinismo milenar que impunha ao homem o papel de mandar e à mulher a obrigação de obedecer.
Os novos papéis assumidos pela mulher que retiraram a ênfase na procriação para ressaltar ofícios de autodeterminação causaram conflitos de identidade e relacionamento. Para a mente humana a alteração de velhas normas de comportamento herdadas de outros séculos, produz dificuldades uma vez que destrói a estrutura psicológica.
Acostumados aos valores que por milênios permaneceram intocados, muitos homens ainda não aceitaram a nova realidade que estende à mulher direitos de autonomia, cidadania, domínio de sua sexualidade, considerados exclusividade dos homens.
A resistência em aceitar que a relação afetiva não deve ser mais um exercício de poder por parte do homem, tem ocasionalmente patrocinado a violência e crimes sangrentos contra a mulher.
Acrescente-se a isto, a tendência moderna de encarar o amor não mais como um princípio alterocêntrico, centralizado nos outros, e sim como um mero sentimento egocêntrico centralizado, portanto, no próprio eu.
Há um egoísmo nas definições humanas. Um egocentrismo de atração negativa. O amor do outro tem como única finalidade me fazer feliz. A poesia da música popular está repleta de expressões que confirmam esta verdade: “o meu mundo acabou sem você”, “você precisa me fazer feliz”, “quero sempre ter o seu amor”, “sem você não sou ninguém”.
Existe íntima relação entre o individualismo, o egoísmo e a violência latente. O vazio emocional criado pela ausência desse “tudo” para a vida, pode levar a atos extravagantes, especialmente aos violentos. São as tragédias causadas pelo ciúme quando um dos cônjuges percebe a iminência da perda da pessoa amada.
A sensação de perda desse aditivo para a vida, basicamente, deixa a autoestima ameaçada. O dominador perde até o senso de suas características e passa a explicar seu chauvinismo e outras mórbidas atitudes como necessárias, razoáveis e justificadas.
Não é plano de Deus que marido e mulher sufoquem a individualidade um do outro. Por ser o direito de escolha moralmente indispensável, tanto a mulher quanto o homem tem o direito de recusar o desejo da pessoa que supostamente ama, de lhe controlar a vida e até seus pensamentos.
A liberdade de escolha dá ao indivíduo o direito de fazer o que desejar com a sua própria vida, mas não lhe concede o direito de fazer o mesmo com a vida dos outros. A mulher tem o direito de controlar o uso de seu próprio corpo. Jamais deveria ser forçada a manter relacionamentos com pessoas que lhe sejam repugnantes.
Fomos dotados pelo Criador, do direito de livre arbítrio. (Deuteronômio 30:19) É o direito de escolha entre o bem e o mal. É esse direito que faz uma pessoa moralmente livre e a torna responsável por suas ações. A destruição desse direito, seja por coerção familiar, pressão social, por preconceitos ou pela ideologia patriarcal atualmente em decadência, não deixa a pessoa sem vida, morta, mas a deixa sem a possibilidade de viver como um ser humano livre. E um ser humano sem liberdade é muito mais desumano do que Deus queria que fosse quando o criou.
Marcos Osmar Schultz – Pastor