Já reparou que somente os outros erram, nós, ao contrário, quase nunca erramos? Percebeu, por exemplo, que dirigimos corretamente — umas raras vezes atravessamos o sinal vermelho, mas o carro já estava no meio da rua afinal, noutras, estacionamos em local proibido, mas são por míseros segundos — e os outros é que são os barbeiros do volante? Conhecemos muito e temos sempre larga experiência em assuntos variados, os outros, lamentavelmente, são atrasados e não possuem o mesmo nível de esperteza para nos acompanhar. Falamos mal dos outros, mas ficamos enraivecidos quando ocorre o inverso. Ofendemos e não admitimos qualquer insinuação desfavorável a nosso respeito. Mais: Já notou que pedimos para que as nossas falcatruas sejam toleradas em nome da simpatia e da piedade universal, mas somos duros juízes quando é o outro que desliza na ladeira dos jeitinhos ilícitos? E no trabalho, sempre nos dedicamos ao máximo, mas os outros… Não é estranho?
Vale lembrar que pensamos assim em razão de estarmos convictos acerca do quanto somos melhores do que as outras pessoas, pois elas ainda não entenderam o que é certo de se fazer na vida. Mas, por que será que as nossas convicções alcançam tamanha velocidade se é possível comprovar quão lentos somos na estrada da vida, e que derrapamos bastante nas curvas da aprendizagem?
Embora o ser humano possua diferentes níveis de desenvolvimento em relação ao outro, ainda que a visão de mundo seja construída particularmente dentro da cabeça de cada um, mesmo que nos sintamos melhor ao desvalorizar outrem e valorizar a si mesmo, é importante destacar o autoengano a que nos submetemos em graus que podem variar da completa falta de conhecimento a seu respeito à sua visão menos embaçada, considerando-se, contudo, que a luta íntima permanente é o fator decisivo para se reduzir a autoilusão com o tempo, e que não há mudança significativa se a acomodação der as cartas no jogo do autoconhecimento. Somente o incômodo que se segue às honestas reflexões pessoais é capaz de trazer luz e impedir que a pessoa se mantenha tão cega no mesmo lugar com tanto potencial disponível à frente.
É aprender consigo mesmo tanto quanto seja necessário para deixar para trás o peso já desnecessário de autoconceitos irrelevantes ao crescimento e adquirir nova bagagem em prol de evoluir a novas rotas. Mas há um preço a se pagar: somente a própria pessoa pode se autorizar a empreender tal transformação, ninguém mais é capaz de fazê-lo além de si mesmo. Não é justo e coerente?
Armando Correa de Siqueira Neto – Psicólogo, Amigo e colaborador do Cada Dia, palestrante, professor e mestre em Liderança. Coautor dos livros Gigantes da Motivação, Gigantes da Liderança e Educação