O Desafio para a Modernidade Brasileira

O Primeiro Mundo nos fascina, sempre nos fascinou. Apreciamos o seu nível médio de instrução, sua educação cívica, sua ética no trato do que é público, sua modernização tecnológica, seu excedente econômico, sua ciência, enfim, tudo aquilo que resulta do processo histórico constitutivo da modernidade europeia.

O fascínio pelo Primeiro Mundo, que, não nos iludamos, tem seu contraponto em nossa baixa auto estima nacional, vem acompanhado de um iniludível desconforto quando pensamos em termos de equiparação do Brasil com os índices almejados da América do Norte e da Europa. Quando assim procedemos, logo somos tomados de assalto pela constatação de que o nosso povo é diferente, de que a nossa gente é outra e, o principal, que justifica a primeira evidência: de que a nossa História não é a mesma das nações modernas do hemisfério Norte. Aí reside a tensão. Como poderemos chegar aos índices numéricos da civilização do Primeiro Mundo ocidental se a formatação atual de tal civilização só pode ser explicada por uma trajetória histórica iniciada a cerca de seiscentos anos atrás com o início da modernidade europeia traduzida pelo fenômeno do Renascimento? Como fazê-lo se a nossa historicidade – definida pelo filósofo Hans George Gadamer como a constituição intrínseca do espírito de um povo – é tributária do latifúndio e da escravidão?

A escravidão e o latifúndio deixaram-nos marcas. Este binômio legou-nos a submissão política, o desmazelo com a individualidade e com a dignidade humana, a ignorância e a exclusão social, para não mencionar o retardo econômico proveniente da ausência de um mercado consumidor amplo, um pré-requisito fundamental à qualquer economia e sociedade moderna. Criou também uma elite que não enxerga limites ao mando, e que é, portanto, essencialmente autoritária e avessa à democracia, que é pedante e excludente, que viciou-se em medir as pessoas pelo quanto elas têm, seja em títulos – quem não percebe como esta elite gosta de ser chamada de doutor? – ou pelas posses materiais.

Seríamos levados então a conclusão inexorável de que tudo está perdido ? De que somos vítimas de nossa História? Claro que não. O que este conjunto de constatações deve nos levar a concluir é que a nossa historicidade demanda um caminho diferente, soluções diferentes para os nossos desafios, que são distintos daqueles que os países do hemisfério Norte Ocidental enfrentaram. Nada está perdido. Vários dos países socialmente mais desenvolvidos da Europa vivenciavam uma experiência de grande pobreza e ignorância até cerca de sessenta anos atrás.

E como chegar aos índices modernos que desejamos? Infelizmente não há fórmulas de bolo disponíveis. Certamente o Brasil não deve mais aspirar a ser o país do futuro – que nunca chega e limita as suas possibilidades na inércia desta certeza vivida no presente – isso, já superamos após o fim da experiência trágica da ditadura militar. No entanto, há princípios fundamentais a serem observados, como a prática de uma nova ética do indivíduo no espaço público, uma ética que não se verga aos valores da mera aquisição material e que mantém a idéia de probidade e de serviço à comunidade – da qual o equilíbrio é decisivo para o nosso bem estar e da nossa família; a avaliação dos políticos não pelas obras grandiosas que realiza – coisa de eleitor subdesenvolvido deslumbrado – mas pelo quanto este gastou em educação, primeira medida para qualquer nação chegar aos índices sociais, políticos e econômicos modernos; a realização de uma ampla reforma agrária, a fim induzir a inclusão social; o desenvolvimento econômico e políticas públicas vigorosas de distribuição de renda – ou alguém aí conhece um outro ente que opere a distribuição de renda que não o Estado ? – e uma maior participação organizada de nossa sociedade, seja através de ONGS., movimentos populares, igrejas, associações ou sindicatos. O Brasil não pode ser refém ou se fazer de vítima do seu passado. Nossa história foi, de fato, de exploração. Mas isto, longe de ser um fator de desânimo, deve constituir um incentivo a mais para que façamos as reformas transformadoras que os nossos antepassados não operaram – ou operaram apenas parcialmente. O Brasil vive hoje um momento de ajuste de contas com a sua História. As eleições municipais que se aproximam jogam um papel fundamental nesse processo. Cabe a cada um de nós, eleitores, decidirmos se queremos fazer do nosso voto um tributo à nossa complexa história ou se queremos fazer dele um instrumento para o acerto de contas com ela.

André Azevedo – Professor de História da UERJ. Doutor em História Social da Cultura pela PUC-RJ.

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Pericles Ramos

Olá, sou Pericles Ramos, sou Terapeuta Familiar e Palestrante na área da Família, formado em Filosofia e Teologia. Há 27 anos, escrevo artigos para sites e apresento programas em várias rádios.

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